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Geral

Poemas de Michel Reis


PAREM DE NOS MATAR

Quantos corpos mais?

Milhões de assassinos policiais

Atiram primeiro, perguntam depois

Mais uma vida ceifada, mais uma vida se foi

111 tiros, prêmio por conseguir o primeiro emprego

Medo, sangue, desespero

Todos os dias minha mãe reza pra eu não ser mais uma vítima

Um corpo no chão com provas destruídas pela perícia

“Por que o senhor atirou em mim?”

como último suspiro

Muitos sonhos interrompidos antes do vale do silício

É morticínio, genocídio

São muitos Ítalos

Onde querem armas na mão

De policiais assassinos

Viatura nova para arrastar mais uma Claudia

Forjar disparo e plantar outra arma

Combater corrupção recebendo arrego semanal

Passando informação que resulta em assalto na Central

Enriquecem a Taurus numa lógica infinita

Maria Eduarda mais uma vítima da guerra capitalista

Tinha o sonho de estudar e melhorar a favela

Mas quantos mais vão morrer em nome dela?

Quantos de vocês lembram da Evelin, da Emely ou do Jeremias

Manoela do Limoeiro e da Nicolly da Rocinha?

3 pessoas morrem extraoficialmente por dia

Não se apontam culpados

Pois eles trabalham para delegacias

Ostentam distintivos e medalhas por matar inocentes

Enquanto são aplaudidos por aqueles que defendem

Que um jovem preto como eu

Não tenha futuro, seja morto em um bar

Que não tenha oportunidade nos estudos

Aqueles que se apropriam do nosso suor

Pra mandar o filho passar férias em Bachelor

E agora Freixo será que acredita em policial antifascista?

Vocês não se importam com o Anderson nem com a Marielle, racistas!

Só estão preocupados porque atingiram alguém do partido

Logo tudo será esquecido

Então não se preocupem, pois o alvo nunca será vocês

Pedem apuração, investigação, falam de medo

Saibam que na periferia nós sabemos o que é isso desde cedo

Continuarei a gritar enquanto não vierem me calar

PAREM DE NOS MATAR!

Eu não sou seu negro

Eu sou negro sim!

Eu sou preto!

Sou maloqueiro, sou respeito

Filho de Zumbi e neto de Dona Dinda

Que não esqueceu Malê, nem Altamira

Minha filha se chamará Dandara

Para homenagear uma rainha

Meu filho se chamará Amiri Baraka

E reinará ao lado de uma Pretinha

Eu resisto como Rosa Parks

Eu estudo como Ida Wells

Eu prefiro Bel Hooks à Marx

E sou uma homenagem ao Michael

Mesmo me chamando Michel

Eu sou preto chave, sou vida

Quero ser eternizado como o Madiba

Quero lutar como Marcus Garvey

Ter a paz de Bob Marley

E se precisar morrer como Nkrumah, morrerei

Então me mate!

Quero libertar como o Sankara

Ser herói como Lumumba

Minha avó não era escrava

Ela é alguém abençoada por Dandalunda

Tenho pai preto, mãe preta

Minha parte branca é um comprimido de dorflex

E pra que eu nunca esqueça

Na minha parede tem uma foto do Malcolm X

Quero ganhar um Nobel como o Soyinka

Tocar como o Ray Charles

Conhecer Uganda, Angola e o Mali

Vou pintar uma bandeira de Burkina Faso

E lembrar quem venceu no Haiti

Ensinar quem foi Milton Santos, Rebouças e Machado de Assis

Agradecer Carolina Maria de Jesus

Ela sim é hor concours

Viva ao Mano Brown, Sabotage, Carlos Marighella

A todos os poetas afro uruguaios

E a quem venceu saindo da favela!

Preto Negro
Eu sou o preto negro

Tipo A

Difícil de lidar

Aquele articulado

Que não é passado pra trás

Não é o macaco

Não é o neguinho

Que não luta contra o estado

Mas sei também que por isso sou um alvo

E se algum dia eu aparecer

Na TV por ser alvejado

Saibam que vai ser forjado

Como tantos outros que aparecem por aí

Eu sou o preto negro

Aquele que não gostam de ter por perto

“Esse nego se acha esperto”

“Precisa voltar pro seu lugar”

Por que será que incomoda a minha presença?

Talvez seja a descrença

Que você tem em ser melhor

Eu sou o preto negro

Eu não sou teu amigo

Mas você quer foder comigo

Porque meu pau é grande

Mas depois vai ficar distante

Pois não sou parte do que tu vive

Eu sou preto negro

Você quer me usar

Mas não posso frequentar

O mesmo lugar que você

Tenho que morar tão longe

Não posso ter meu carro

Pois o homem fardado

Vai dizer que fui baleado

Por resistir

Eu sou preto negro

E não vou desistir

Eu vou viver

Eu só quero viver

Não tente me impedir de SER



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Sobre Michel Reis

Paulistano de 27 anos (contrariando as estatísticas), estudante de Letras da Universidade Federal de São Paulo, poeta nas horas vagas e sonhador em tempo integral).

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