A Mística Feminina- Betty Friedan

Texto por Mayra Guanaes.

 

Há 50 anos, quando o livro A Mística Feminina já estava na gráfica para sua 1ª edição, Betty Friedan resolveu tentar obter seu Ph.D. Mesmo com seu histórico exemplar como pesquisadora, o chefe de departamento de psicologia social de Columbia considerou que talvez ela não pudesse lidar com os rigores acadêmicos da pós-graduação. Sabem como é, naquela ocasião, ela já tinha 42 anos e tinha passado os anos mais recentes de sua vida como esposa dona de casa. O chefe de departamento perguntou por que ela queria incomodar a mente dela com a obtenção de um Ph.D. Então, começo esta resenha perguntando: Se fosse um homem pleiteando um Ph.D haveria esta questão?

 

Em A Mística Feminina, a psicóloga, jornalista e ativista estadunidense Betty Friedan discute o lugar que a sociedade reservou para as mulheres como esposas, mães e donas de casa, gerando um sintoma social que ela chama de “problema sem nome”, um vazio existencial que afetava as mulheres estadunidenses heterossexuais, brancas e moradoras dos subúrbios de classe média.

 

Apesar deste recorte, é possível observarmos com este livro, que é escrito como um relato em 1ª pessoa, como estes ideais sobre o que as mulheres devem ser são sustentados socialmente, por exemplo, pelos meios de comunicação.

 

Para Betty Friedman a questão central do problema sem nome é “uma estranha discrepância entre a realidade de nossa vida como mulheres e a imagem à qual tentávamos nos adequar, imagem que passei a chamar de mística feminina” (p. 9). O que Friedman nos mostra em sua longa pesquisa, é como as mulheres parecem infelizes ao tentarem se adequar a estes papéis de esposas, mães e donas de casa.

 

O livro, publicado pela primeira vez nos Estados Unidos em 1963 e em 1971 no Brasil, apresenta os efeitos da mística feminina sobre as mulheres em 14 capítulos que exploram as diversas faces desta questão: 1. O problema sem nome; 2. A feliz heroína; 3. A crise na identidade; 4. A jornada apaixonada; 5. O solipsismo sexual de Sigmund Freud; 6. A paralisia funcional o protesto feminino e Margaret Mead; 7. Educadores orientados pelo sexo; 8. A escolha errada; 9. Comércio orientado pelo sexo; 10. As tarefas domésticas expandem para ocupar o tempo disponível; 11. Pessoas em busca do sexo; 12. Desumanização progressiva: o campo de concentração confortável; 13. O self perdido; 14. Um novo plano de vida para as mulheres. Então, de uma maneira bem eloquente, a autora nos ajuda a compreender como é viável para a sociedade capitalista manter as mulheres em casa.

 

Um ponto que me pareceu bastante interessante é que podemos perceber como há uma mudança de pensamento entre as mulheres estadunidenses brancas de classe média. Antes elas tinham ideais mais libertários tendo como modelo as sufragistas, mas depois começaram a tentar incorporar a mística feminina que também funciona como mecanismo de controle de gênero, projetado pelos homens que voltavam da guerra. Me chamou a atenção como o contexto social favorece os padrões sexistas, dos quais até hoje tentamos nos libertar. Muitas mulheres entrevistadas tiveram acesso à educação e até tentavam defender os modelos, apesar de reconhecerem que havia algo estranho mesmo vivendo em uma família de alto padrão.

 

A Mística Feminina é considerada uma obra pioneira e esta edição publicada pela Rosa dos Tempos comemora os 50 anos da 1ª Edição, trazendo textos inéditos da autora. Ao ler este livro, podemos compreender o motivo de sua importância, além da reflexão que nos provoca, a leitura deste livro teórico é muito fluida, alternando a voz de Betty Friedan com a voz de outras mulheres que foram entrevistadas. É, com certeza, um livro para ser lido mais de uma vez. 

 

Na luta das mulheres por uma sociedade mais igualitária ainda há muito o que se fazer, embora já estejamos caminhando.

 

No Brasil, a feminista paraibana Hildete Pereira de Melo, economista da UFF, liderou uma pesquisa que mostrava o quanto aqui no país o trabalho doméstico não remunerado é uma atividade de importância para a economia. O estudo realizado em 2007 identificou que os afazeres domésticos, realizados em sua maioria pelas mulheres, corresponderam a 11,2% do PIB brasileiro do período entre 2001-2005. Portanto, é preciso continuar estudando, trabalhando e seguindo em frente pela libertação de todas as mulheres.

 

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Exemplar recebido em parceria com a editora.

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Maria Ferreira

Maria Ferreira é uma mulher negra baiana. É criadora do Clube Impressões, o clube de leitura de livros de ficção do Impressões de Maria, e co-criadora e curadora do Clube Leituras Decoloniais, voltado para a leitura e compartilhamento de reflexões sobre decolonialidade. Também escreve poemas e tem um conto publicado no livro “Vozes Negras” (2019). É formada em Letras-Espanhol pela Universidade Federal de São Paulo. Seus principais interesses estão relacionados com temas que envolvem literatura, feminismo negro e decolonial e discussões sobre raça e gênero. Enxerga a literatura como uma ferramenta essencial para transformar o mundo. 

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