Ninguém precisa acreditar em mim- Juan Pablo Villalobos


Texto de Mayra Guanaes
Ninguém precisa acreditar em mim, mas tentarei escrever essa resenha de forma mais distanciada possível. Não é preciso dizer que apesar da vontade de tentar, já sei da possibilidade do meu fracasso, isso, porque como Juan Pablo diz durante sua narração, “as pessoas de letras se apaixonam e gostam de sentimentos” e eu sou uma apaixonada pela obra do Juan Pablo Villalobos, embora eu tenha a impressão de que isso não acontece exatamente pela minha formação em Letras.

Comecei despretensiosamemte lendo o primeiro dele, Festa do covil que terminei em menos de um dia. Foi numa sentada só. Depois como quem não queria nada, li o segundo E se vivêssemos num lugar normal? E no terceiro, Te vendo um cachorro,  percebi que sempre quando sai um livro novo dele, é inevitável não correr pra comprar, assim, a notícia de que Juan Pablo Villalobos vinha lançar um livro novo, fez eu juntar minhas últimas economias e correr para o lançamento. A paixão é essa, quando você percebe, não dá pra reverter, devemos viver isso, primeiramente é intensa e avancei nos primeiros capítulos bem rápido, mas a partir da metade já comecei a me lamentar, a sensação de fim próximo, as últimas páginas. Depois disso o que sobram são as resenhas.
Ninguém precisa acreditar em mim é o mais recente romance do escritor mexicano Juan Pablo Villalobos. É um jogo com o estilo de autoficção, popular na literatura contemporânea, em que você não sabe o que aconteceu realmente na realidade e o que é ficção, ainda que tudo possa ser lido como ficção.
Nele, temos o narrador Juan Pablo, que vai fazer doutorado em Barcelona mas acaba se envolvendo com mafiosos sendo que o pior que pode acontecer a alguém da pós-graduação é qualquer tipo de contratempo que promova um desvio de sua pesquisa. Parece que o narrador está em Barcelona fazendo de tudo, menos sua pesquisa.
O livro também discute a questão do humor, em várias partes, porque este é o tema da pesquisa de doutorado de Juan Pablo. Há um jogo bem interessante com os estereótipos de nacionalidade, principalmente com os mexicanos, visto que Juan Pablo Villalobos é mexicano e mesmo uma piada com estereótipos pode ser engraçada, dependendo de quem conta.
Temos também uma Barcelona que a gente nunca ouviu falar, que não vimos em Merlí. E se eu tivesse acesso ao original em espanhol, teria achado lindo porque ouvi dizer que apresenta 3 variações diferentes da língua espanhola falada no México, na argentina e em Barcelona. Mas se não posso comentar tanto sobre as questões linguísticas por ter lido a tradução, devo mencionar que literariamente é uma obra interessantíssima e mesmo que eu seja formada em Letras, ninguém precisa acreditar em mim.
O autor intercala vozes narrativas diferentes. Tem o narrador, Juan Pablo mas também tem as partes narradas pela namorada dele, Valentina  que escreve em um diário, há cartas do primo que o envolve em um negócio com mafiosos e a mãe de Juan Pablo que escreve e-mails a ele e sinceramente, é de fazer qualquer pessoa que não acredita no quanto o Brasil se parece com o México rever tudo. Se não tinha sido possível perceber nossas semelhanças assistindo Chaves, é com essa mãe, que tem expectativas como a minha mãe e a sua que é chegado o momento. Se estiver com preguiça de ler, apesar das primeiras páginas serem divertidíssimas, abre logo nas páginas com os emails da mãe, que a obra desse escritor vai viciar você.
Esse novo livro retoma a minha sensação de sempre ler os livros do Juan Pablo Villalobos de um jeito meio incrédulo de boca aberta, entre uma risada e outra. Tenho sempre o mesmo encadeamento de pensamento, primeiro tem um “não estou acreditando disso” e depois “isso é genial”. Claro, ninguém precisa acreditar em mim.
Juan Pablo fala que a piada é engraçada dependendo de quem está contando. E é nesse quarto livro que fica muito evidente o humor mexicano rindo de si mesmo, brincando com seus próprios estereótipos. O efeito de humor se dá quando acontece uma quebra de expectativa e Juan Pablo Villalobos faz isso, de um jeito ácido e no final do romance, há um desfecho que comenta as questões da literatura e da autoficção, o autor mostra muito domínio e precisão da linguagem literário.
O humor é aquele campo muito fácil de perder a mão, mas Juan Pablo Villalobos segue firme em mais um trabalho que apresenta personagens mexicanos de um jeito crítico mas sincero e logo, encantador, produzindo  mais do fino da literatura mexicana.
Ninguém precisa acreditar em mim
Juan Pablo Villalobos
2018
Companhia das Letras
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4 respostas

  1. Não conhecia o autor, mas senti empatia pela frase que diz respeito aos estudantes de letras kkkk
    Parecem ser obras intensas mas muito maravilhosas. Fiquei com vontade de conhecer, adorei a dica!!

    Parabéns pelo post lindo!

  2. Oi, Bianca! Esse livro tem várias referências aos estudantes de Letras porque o autor é um e o narrador do livro também! É divertidíssimo! E também recomendo fortemente o Festa no Covil! 🙂

  3. Oi, Rê, obrigada! Agradeço muitíssimo à Maria por ter me convidado para colaborar com o blog dela. Volte sempre! Visitarei seu site também! 🙂

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Maria Ferreira

Maria Ferreira é uma mulher negra baiana. É criadora do Clube Impressões, o clube de leitura de livros de ficção do Impressões de Maria, e co-criadora e curadora do Clube Leituras Decoloniais, voltado para a leitura e compartilhamento de reflexões sobre decolonialidade. Também escreve poemas e tem um conto publicado no livro “Vozes Negras” (2019). É formada em Letras-Espanhol pela Universidade Federal de São Paulo. Seus principais interesses estão relacionados com temas que envolvem literatura, feminismo negro e decolonial e discussões sobre raça e gênero. Enxerga a literatura como uma ferramenta essencial para transformar o mundo. 

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