Em Manifesto sobre nunca desistir (Companhia das Letras, tradução de Camila Von Holdefer ), a autora Bernardine Evaristo, vencedora do prêmio Book Princer em 2019 com o título Garota, mulher, outras, nos presenteia com um relato sincero sobre sua caminhada.
Bernardine Evaristo divide sua trajetória em sete capítulos, nos quais conhecemos parte de sua infância, família e origens; os lugares que chamou de casa e lar; seus relacionamentos; o teatro e a performance na sua vida; sua poesia e forma como iniciou algumas de suas obras; suas influências e por fim, sua ambição e ativismo. A autora deixa muito claro o quanto sua origem e a história de seus antepassados foram significativos e importantes para se conhecer melhor. Ela tinha uma ânsia muito grande em conhecer sua herança familiar.
Seu pai, nascido no Camarões e criado na Nigéria, imigrou para Inglaterra em 1949, época em que o país estava recrutando pessoas das colônias, devido as baixas da segunda guerra mundial. Já sua mãe era inglesa e se tornou professora. A união dos dois foi um grande desafio, mas eles lutaram para ficar juntos, tiveram oito filhos e se separaram após trinta e três anos de casamento.
Ao longo do livro a autora conta mais sobre suas descobertas com relação a família. Algo que me deixou surpresa foi saber que seu avô, por parte de pai – Gregório Bankole Evaristo – foi uma das pessoas que retornou do Brasil após o final da escravidão em 1888. Ele se tornou funcionário da alfândega e depois conheceu sua segunda esposa Zenobia, vó de Bernardine.
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Depois de contar sobre a família, a autora se concentra em diversos temas, trabalhados profundamente em cada um dos capítulos. Gostei muito da fala sobre a importância do teatro em sua vida, acredito que até acabei me identificando em alguns momentos, já que também tive alguns desses pensamentos com relação a essa carreira. Ela diz:
“Nunca levei em consideração a ideia de não trabalhar no teatro, apesar da minha renda errática; era minha paixão e eu tinha que realiza-la. A ideia de ficar presa a uma dívida hipotecária me assustava. Imaginava que teria que aceitar um emprego das nove as cinco para poder paga-la, fazendo algo que odiava. Antevia, pela rotina, minha imaginação assassinada, meu espirito livre aprisionado, meus sonhos irrealizados. Refleti que preferia ser pobre, o que é ótimo, porque eu era”.
A autora também conta de suas frequentes mudanças de casa e como o fato de ter morado sozinha por tanto tempo foi inestimável para o desenvolvimento e o processo de sua escrita. Tem um momento em que ela explica que começa escrever um livro em um determinado gênero literário e termina em outro, nos mostrando que esse processo não tem regras definidas, tudo pode mudar. Fala também de seus romances com as mulheres e homens que passaram e marcaram sua vida, até que em 2006 conheceu seu marido.
Em relação ao ativismo de Bernardine Evaristo, destaco este trecho:
“Como escritora, meu projeto tem sido explicar a diáspora africana – passada, presente, real, imaginaria – a partir de múltiplas perspectivas. Acolho o termo “escritora negra”, porque, numa sociedade racializada acho importante focar nessas narrativas”.
Manifesto sobre nunca desistir é uma obra muito rica e pode potencializar nossa entendimento sobre a vida a partir das experiências e vivências da autora e com certeza poderá ser uma leitura muito enriquecedora.