A alquimia da tempestade- D.G. Ducci

Este é o primeiro livro autor, lançado pela pela editora 7Letras. O mesmo é separado por duas partes. A primeira é “Outros Poemas” e a segunda é “Alquimia da Tempestade”, que possui uma divisão própria. Vou começar de modo inverso, falando primeiro de “Alquimia da Tempestade”.

Em um primeiro momento, tive a impressão de que “Alquimia da Tempestade” era um grande poema épico, só que dividido em vários outros poemas menores, separados por partes que juntas compõem uma tempestade: A brisa, o vento, a chuva, o furacão. Sensação reforçada pelo fato dessa parte ter início com um “Prólogo e Invocação”. Mas a semelhança com o gênero acaba aí, pois ao longo da leitura se percebe que os poemas se aproximam mais do arcadismo, do que de uma poesia épica propriamente dita, uma vez que é recorrente a exaltação da figura feminina e o uso de sonetos.


Dos quatro grandes grupos citados anteriormente, que fazem a divisão do poema, em “A Brisa”, destaco o poema “Romantismo Árcade”, em que, por meio da emulação, o autor compõe versos com base na Lira I, de Marília de Dirceu, grande poema de árcade de autoria de Tomás Antônio Gonzaga:

“Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
Que viva de guardar alheio gado;
De tosco trato, d’expressão grosseiro,
Dos frios gelos e dos sóis queimados”.
“Eu, querida, não sou aventureiro
que busque um novo amor a cada prado,
que pelos campos ande meio faceiro
E que por todos seja idolatrado”.
Os demais poemas vão retratar uma mulher idealizada, um amor incondicional, irrealizado e um poeta que sempre se dirige a uma musa, o que demonstra uma forte influência do Ultrarromantismo de Álvares de Azevedo.
Em “O Vento”, tem-se um eu-lírico que se mostra mais determinado a conquistar sua amada, que nunca deixa de fantasiar a concretização de seus desejos, mas ao mesmo tempo caminhando para uma desilusão que só é afastada nos poemas finais, quando finalmente consegue realizar suas vontades.
A forma de sonetos deixa de ser usada em “A Chuva”, mas a nova forma usada ainda é composta por quatorze versos, com os dois últimos destacados dos demais.
“O Furacão”, que particularmente foi a parte que mais gostei porque é onde se sai um pouco do engessamento da forma e se tem uma estrutura mais livre, ainda que sempre rimada. Dessa parte, destaco os poemas “Ritornello”, em que cada verso das suas estrofes de treze versos cada, se iniciam com um verbo no imperativo, seguido de um ponto de exclamação, que enfatiza a ordem. “Vês”, que tem uma sonoridade provocada pelo uso de palavras iniciadas com a letra “v”:

“Vago por aí como falso vigia/ vácuo vacilante na vaidade que havia./ Dispo essa verdade, visto fantasia,/ como velho veludo, velharia.

 Outro que faz com que o leitor preste atenção em sua sonoridade é “Ponto”:

“O ponto preto preso ao teto/ apaga a paz que aqui me passa/ em pontos principais/ do afeto.

“Outros Poemas” começa com “Poesia-gangrena”, um poema que faz uma crítica bem feroz à escrita que se pretende poética, mas que não aparenta ter nenhuma base de estudo em sua composição:
“Esboce aqui um poema-sucesso
superdiferente
alternativo, mas nada maldito
sem tanto trabalho
porque sentir é bom mas pensar doí”.
Nesses “Outros poemas” há uma variedade na forma e nos assuntos, mas é uma constante um certo mau-humor, certa crítica do eu-lírico às pessoas que preferem uma poesia mais fácil de ser consumida, tanto pelo autor, quanto pelo leitor.
É verdade que os poemas são de fácil entendimento, com uma linguagem bastante acessível, mas chega uma hora que a estrutura se torna repetitiva. Para um leitor menos familiarizado com os movimentos literários e as métricas clássicas, talvez não seja uma leitura tão proveitosa, mesmo eu, que estudei Poesia na faculdade, fiquei com o sentimento de que deixei alguma coisa passar, alguma referência que desconheço.
Ainda assim, é inegável o valor da obra e sua importância em uma realidade na qual não se fazem mais poemas como antigamente. O que transforma o livro é uma relíquia.

O livro pode ser encontrado no site da editora 7Letras

*Exemplar cedido pela Oasys Cultural 

5 respostas

  1. Oi Maria.

    Esse livro sem duvida nenhuma é muito bom, principalmente para leitores que apreciam uma ótima poesia. Confesso que não conhecia e pela sua resenha, eu quero ter na minha estante. Dica anotada e parabéns pela dica.

    Bjos

  2. Oi Maria!!!
    Não sou muito fã de poemas, só alguns me chamam a atenção.
    Achei legal que o autor separou o livro em duas partes. Não entendo muito de poemas épicos ou arcadismo. Sempre acho difícil comentar posts de resenhas de livros com poemas, porque cada um os sente de uma forma, mas que bom que você gostou, isso é o mais importante!
    Beijos!

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Maria Ferreira

Maria Ferreira é uma mulher negra baiana. É criadora do Clube Impressões, o clube de leitura de livros de ficção do Impressões de Maria, e co-criadora e curadora do Clube Leituras Decoloniais, voltado para a leitura e compartilhamento de reflexões sobre decolonialidade. Também escreve poemas e tem um conto publicado no livro “Vozes Negras” (2019). É formada em Letras-Espanhol pela Universidade Federal de São Paulo. Seus principais interesses estão relacionados com temas que envolvem literatura, feminismo negro e decolonial e discussões sobre raça e gênero. Enxerga a literatura como uma ferramenta essencial para transformar o mundo. 

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