A metamorfose- Franz Kafka

Foto: Amanda Medeiros

Este é um livro que transita entre a classificação de novela e conto, escrito em apenas vinte dias no ano de 1912 e publicado em 1915. A temática é a transformação de um homem em inseto e as transformações desencadeadas em sua vida em decorrência disso.

É dividido em três partes. Na primeira, damos de cara com um Gregor Samsa que acorda transformado em um “inseto monstruoso” e o primeiro pensamento que lhe vem à cabeça é questionar o motivo de não ter ouvido o despertador tocar para que pudesse ter ido trabalhar e quando se dá conta de sua nova condição, só vê como um problema quando percebe que não conseguirá ir trabalhar e começa a pensar em como sua família reagirá a isso. Quando a família, que é composta pelo pai, pela mãe e pela irmã, Grete, descobre no que Gregor se transformou, a primeira reação é a de asco, de nojo e se afastam imediatamente. Grete é a única dos familiares que ainda mantém algum contato e o alimenta. Uma das principais preocupações de Gregor é não poder mais sustentar a família e não poder liquidar a dívida dela.
A segunda parte apresenta o cotidiano de Gregor, sua rejeição pela família e seus sentimentos por ter sido rejeitado. Há aqui também um processo de animalização de Gregor, pois ele começa a agir e comportar-se como o inseto que agora é, além das perdas gradativas dos sentidos que estabelecem uma ligação do seu interior com o exterior, como a imcapacidade de se comunicar, pois sua voz não é mais entendida por seus familiares, a perda da visão e o do paladar, pois a comida servida por sua irmã não lhe apetece mais. Além disso, se vê cada vez mais isolado das atividades familiares e preso em seu quarto, que ao mesmo tempo que funciona como um confinamento, também funciona como proteção.
Seus familiares se mostram cada vez mais hostis, não veem outra alternativa a não ser eles mesmos começarem a trabalhar para se sustetarem e até alugam um quarto do apartamento em que moram para ajudar na renda. Ainda que não haja uma marcação clara de quanto tempo dura a narrativa, é possível depreender que em menos de um ano, a família Samsa passa por uma queda social vertiginosa.
Na terceira parte, Gregor está fraco e abalado psicologicamente, o que o leva a um fim que satisfaz sua família. Eu não queria dizer que o Gregor morre no final para não dar spoiler para ninguém, mas convenhamos que com um livro publicado há mais de cem anos não posso me prender a isso. Pois é, o Gregor morre nessa terceira parte. Ele já não comia e estava muito fraco, além de muito deprimido por ter sido abandonado por sua família. Após sua morte, as coisas maravilhosamente se ajeitam para seus familiares, que nem lamemtam sua morte.

A narrativa dá-se a partir da perspectiva do personagem principal, numa narrativa onisciente, até o momento em que ele está presente na história, após isso, ela enfoca sua família. 
Percebe-se com bastante nitidez o estilo impessoal do autor em sua narrativa feita de forma distanciada, seca e precisa.

O livro todo é uma metamorfose em andamento. Arrisco dizer que o leitor não é o mesmo após essa leitura, que ocorre com ele também uma metamorfose.

3 respostas

  1. Olá, Maria.
    Eu tenho esse livro, mas ainda não tive tempo de lê-lo.
    A premissa é muito boa e me chama a atenção. Essa mudança familiar parece ser interessante para ser analisada. Afinal, mesmo após essa transformação, os pensamentos convergem para a família, certo? Do protagonista com medo de não sustentar os seus; e os seus o rejeitando.
    Ademais, quero conferir essa metamorfose do leitor.
    Ótima dica.

    Desbravador de Mundos – Participe do top comentarista de maio. Serão três vencedores!

  2. Oi Maria, tudo bem?
    Essa coisa de dar ou não dar spoiler é complicada né? Porque tipo, o livro é muito antigo, então não deveria ser spoiler contar o final, mas mesmo assim, tem gente que ainda não teve a oportunidade de ler 🙂
    Eu confesso que não dou muita bola para isso. As vezes, mesmo conhecendo todo o final de uma história resolvo ler. Afinal, algumas histórias a gente precisa conhecer de qualquer jeito, entender o que levou até ali.
    E este livro é um caso assim.
    Já li o livro e acho que até já conhecia o final. Mas a importância dele são os debates que eles podem causar. A comparação com a realidade e nossos doentes, idosos… Confesso que não curti tantoooo assim a leitura, mas o livro causa ótimas reflexões.
    Um beijão
    http://profissao-escritor.blogspot.com.br/

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Maria Ferreira

Maria Ferreira é uma mulher negra baiana. É criadora do Clube Impressões, o clube de leitura de livros de ficção do Impressões de Maria, e co-criadora e curadora do Clube Leituras Decoloniais, voltado para a leitura e compartilhamento de reflexões sobre decolonialidade. Também escreve poemas e tem um conto publicado no livro “Vozes Negras” (2019). É formada em Letras-Espanhol pela Universidade Federal de São Paulo. Seus principais interesses estão relacionados com temas que envolvem literatura, feminismo negro e decolonial e discussões sobre raça e gênero. Enxerga a literatura como uma ferramenta essencial para transformar o mundo. 

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