Caderno de um ausente- João Anzanello Carrascoza

Um pai de segunda viagem, já na casa dos cinquenta, teme não poder fazer parte da vida  de sua filha recém-nascida, dada sua idade já avançada. Para suprir essa possível ausência, o pai escreve em um caderno, suas memórias e ensinamentos que quer deixar para a filha. Expressando seu amor e sentimentos  antes mesmo da filha nascer.
O caderno é escrito desde o nascimento da filha até seu primeiro ano de vida. Nesse meio tempo, mostra-se um pai presente e marido apaixonado, com declarações de amor comoventes, presentes em pequenos detalhes, que o leitor atento consegue perceber. Como por exemplo, dizer que a mulher acorda com “os cabelos trançados pelo travesseiro”, ao invés de dizer que acorda com os cabelos bagunçados. São pequenos detalhes como esse que deixam transparecer todo seu amor e atenção.

“(…) porque a equação é simples, Bia, vida menos poesia igual vazio, pássaro menos canto igual angústia, você menos eu igual seu futuro”. (p.71)

Com a narrativa em primeira pessoa, numa prosa poética cheia de metáforas, o pai promove reflexões filosóficas a cerca da vida e do que engloba estar vivo, com uma precisão vocabular e lirismo sem iguais

Embora o livro esteja celebrando um nascimento, a morte faz-se presente em muitos momentos: seja na gravidez de risco vivenciada pela mãe, na certeza do pai de que não poderá acompanhar a evolução da filha, na impossiblidade de Bia conhecer algumas pessoas. O que torna a narrativa mais fidedigna, como na vida real, não se pode ignorar que a morte nos cerca. Para morrer, basta estar vivo.

Publicado pela extinta Cosac Naify, o livro segue a qualidade gráfica característica da editora. Possui um formato pouco encontrado no mercado, pequeno, o que lembra um caderno de anotações, folhas coloridas em um tom de bege, meio creme e os grafismos, espaços em branco que refletem os silêncios e ausências da narrativa.

5 respostas

  1. Ah, como a Cosac Naify fará falta!
    Não conhecia esse livro deles, mas fiquei muito curioso com o enredo. Já li uma obra parecida e amei. Acredito que esta terá o mesmo efeito sobre mim. Sem dúvidas, esse lirismo que a obra contém irá me ganhar.
    Maravilhosa resenha.

    Desbravador de Mundos – Participe do top comentarista de maio. Serão três vencedores!

  2. Oi Maria, tudo bem?
    Só para avisar, essa foto é maldade hein? Hhahah. principalmente para uma chocólatra como eu :3
    Ainda não conhecia o livro, mas achei bem interessante.
    Quando minha afilhada nasceu eu comprei um livro. A ideia era escrever nele e tal e dar de presente a ela quando fizesse 15 anos. Mas a ideia acabou morrendo. Escrevi nos primeiros meses e depois parei 😛 Uma pena, pois seria um presente bem especial 🙂
    Então claro que o livro me atraiu. Só fiquei meio assim. 50 anos é muito novo ainda 😛
    O livro é antigo ? (daí daria para entender a baixa expectativa de vida) ou então o cara era doente? Porque hoje em dia, as pessoas estão praticamente começando a vida aos 50 anos 🙂
    Beijooos
    http://profissao-escritor.blogspot.com.br/

  3. Olá, Maria.
    Não conhecia esse livro ainda e gostei bastante da capa dele. Super simples. E o enredo me pareceu ser emocionante. Mesmo com essa sensação de morte pairando imagino como deve ser para um filho ler algo assim depois de adulto.

    Blog Prefácio

  4. Que ideia legal, Gih! Seria um presente muito especial mesmo.
    Você acha que 50 anos ainda é muito novo? Eu já acho que com essa idade já naõ é tão novo assim, rs.
    Não, o livro é recente. É que o personagem acha que já é uma idade um pouco avançada quando se pensa em ter um filho.

    Abraços.

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Maria Ferreira

Maria Ferreira é uma mulher negra baiana. É criadora do Clube Impressões, o clube de leitura de livros de ficção do Impressões de Maria, e co-criadora e curadora do Clube Leituras Decoloniais, voltado para a leitura e compartilhamento de reflexões sobre decolonialidade. Também escreve poemas e tem um conto publicado no livro “Vozes Negras” (2019). É formada em Letras-Espanhol pela Universidade Federal de São Paulo. Seus principais interesses estão relacionados com temas que envolvem literatura, feminismo negro e decolonial e discussões sobre raça e gênero. Enxerga a literatura como uma ferramenta essencial para transformar o mundo. 

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