Flisertão-Festival Literário do Sertão do São Francisco


Texto por Mayra Guanaes
Entre os dias 29 de agosto e 2 de setembro, aconteceu na cidade de Petrolina – PE, a primeira Flisertão – Festival Literário do Sertão do São Francisco. Descobri  que o evento estava acontecendo durante uma visita ao Museu do Sertão.


A FliSertão tem por objetivo incentivar a leitura e a formação leitora e foi organizada com o apoio de várias instâncias como a prefeitura de Petrolina, Universidades, e a Associação de distribuidores de livros do Nordeste.

O evento contou com mais de 50 atrações, entre elas, oficinas, shows, recitais, lançamentos de livros, exibição de curtas, apresentações de teatro e debates. Tendo como o lema “A literatura vai tomar conta da cidade”, a FliSertão foi carismática: além das bancas com livros a preços acessíveis, havia uma programação ampla, envolvendo várias linguagens artísticas.


Aberto ao público, o evento tinha parceria com várias escolas. Um ponto muito positivo: os professores ganharam créditos para a compra de livros. Além disso, na parte da manhã e tarde, foi possível conferir a participação dos alunos das escolas da região, que inclusive, participaram da programação do palco principal com apresentações de dança e poesia. Acreditamos na efetividade deste tipo de ação para formação leitora.

Alguns alunos da região
O homenageado desta edição foi Antônio Padilha, escritor que narrou a história de Petrolina. Escutamos um cordel sobre ele declamado pela poetisa cordelista, Graciele Castro.
No dia da abertura também vimos uma apresentação do Geocordel – Grupo de Estudo sobre o Cordel (Facape) ensinando a literatura de Cordel na prática: declamando as rimas de vários poetas da região, inclusive, de Chico Pedrosa, um dos convidados de destaque do evento. A literatura de Cordel, parte da poesia oral, nem sempre é valorizada por estudiosos da literatura, injustamente, já que é de força poética riquíssima e faz parte da nossa cultura brasileira. É impressionante, a força da poesia quando é falada.
Apresentação do Geocordel

Outra apresentação que conferimos foi a do poeta Jessier Quirino, arquiteto de formação que enveredou pelo sertão da poesia. Gostei muito da declamação dele do poema “Paisagem do interior”, que nos ensina muito sobre o sertão. Eu, filha de nordestino, me senti mais próxima de minhas raízes, a poesia nos leva até mesmo para os lugares que estão distantes de nós geograficamente.


No segundo dia conferimos um concerto de jazz, uma das partes da programação que estava muito curiosa porque no Museu do Sertão, li que Petrolina tinha uma orquestra tradicional de jazz e ver essa apresentação naquele espaço foi muito significativo porque estava acontecendo dentro de um evento como esse, para todo mundo escutar e indo contra a ideia que muitas vezes se tem de que o jazz é propriedade da elite, ao mesmo tempo que se esquece ele nasceu nos guetos americanos.

Concerto de jazz
Depois assistimos o show do Santanna, O Cantador, que declamou cordel e encantou o público com várias de suas canções, bastante conhecidas no Nordeste. 

Além das atividades artísticas, o evento também promoveu palestras sobre temas presentes na educação, como suícidio – tema que deve ser discutido com urgência, aliás – além de receber a psicóloga e sexóloga Laura Muller.

Nossa experiência com a FlipSertão foi muito positiva porque vimos um evento acessível, gratuito, de qualidade, fomentando a leitura e o saber. Esperamos poder comparecer na próxima edição.

No entanto, senti falta de ver mais poetas mulheres em cena. No cenário da poesia do Sertão, pelos destaques que a FliSertão apresentou, pareceu haver somente homens. No entanto, vimos a poetisa de Petrolina, Graciele Castro, com uma presença significativa, inclusive, dando oficinas de poesia, como já vem realizando como idealizadora do Projeto Ser Tão Poeta,  formando não só leitores e leitoras, mas também mais poetas, valorizando a poesia do Sertão. Pensamos então que deve haver outras poetisas como ela. Lembrei da Isabella Puente que com suas poesias sobre o Nordeste, foi ganhadora da Copa do Mundo de Slam (poesia falada) na França.


Pode parecer bobagem, mas faz uma diferença e tanto, para nós, mulheres, que um dia começamos a ler e depois a produzir e pesquisar literatura, vermos outras mulheres fazendo o mesmo e sendo reconhecidas por isso. Nós que acreditamos em um mundo menos desigual, gostamos de achar que o fato de sermos mulheres, não é impeditivo para termos nosso trabalho reconhecido, tanto quanto os homens recebem seu devido reconhecimento.

Uma vez que a proposta da FliSertão é ampliar o saber, acreditamos que fomentar várias vozes na poesia, é um caminho interessante para que meninos e também meninas se sintam acolhidos e capazes de produzir e mostrar a poesia que existe dentro de si.


Nossa passagem por Petrolina foi curta mas suficiente para adorar a experiência de estar ali e aprender mais sobre o Nordeste.

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Maria Ferreira

Maria Ferreira é uma mulher negra baiana. É criadora do Clube Impressões, o clube de leitura de livros de ficção do Impressões de Maria, e co-criadora e curadora do Clube Leituras Decoloniais, voltado para a leitura e compartilhamento de reflexões sobre decolonialidade. Também escreve poemas e tem um conto publicado no livro “Vozes Negras” (2019). É formada em Letras-Espanhol pela Universidade Federal de São Paulo. Seus principais interesses estão relacionados com temas que envolvem literatura, feminismo negro e decolonial e discussões sobre raça e gênero. Enxerga a literatura como uma ferramenta essencial para transformar o mundo. 

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