Edgar Allan Poe é um nome que dispensa apresentações. Poeta, contista e crítico literário, é um dos grandes da literatura estadunidense. Nascido em Boston em 1809, Poe fora admirado por gente como Baudelaire e Mallarmé e segue com sua obra sendo relevante até os dias atuais. Tanto é que nos últimos anos a Companhia das Letras lançou títulos do autor. Em 2017, a editora publicou Histórias Extraordinárias, com tradução de José Paulo Paes, e neste ano de 2019 foi a vez de O corvo, com traduções do poema por Machado de Assis e Fernando Pessoa e tradução dos ensaios, organização e posfácios de Paulo Henriques Britto, e que é objeto desta resenha.
A primeira coisa que nos chama a atenção ao ter o livro em mãos, é seu projeto gráfico. Na verdade, o certo seria dizer que é praticamente impossível não se voltar o foco para esse detalhe. O livro é lindíssimo! É evidente o capricho que a Companhia das Letras dedicou a essa edição – que segue o mesmo projeto gráfico de Histórias Extraordinárias, e foi elaborado com muito esmero por Alceu Chiesorin Nunes e Sarah Bonet e conta com ilustrações, tanto da capa quanto do miolo, do artista Kako.
O livro é dividido em duas partes. Na primeira, intitulada O corvo, encontramos as traduções de Fernando Pessoa e Machado de Assis para o poema assim como o original, em inglês, The raven. É interessante, nesta parte, observar as escolhas feitas pelos autores em suas traduções, o que faz com que ambos sigam caminhos singulares. Pessoa é mais fiel à forma do poema, enquanto Assis prefere se fazer da liberdade em sua versão. E é sobre as traduções de ambos escritores que Paulo Henriques Britto se debruça em seu ensaio Um raven e dois corvos, que fecha esta parte. Britto esmiúça os trabalhos feitos por Assis e Pessoa, comparando-os entre si e cada um ao poema original, a fim de concluir qual destes fez a melhor tradução.
Na segunda parte do livro, Ensaios, temos a faceta do Edgar Allan Poe crítico literário distribuída em três ensaios. No primeiro deles, A filosofia da composição, Poe argumenta sobre como a composição de um poema é feita “com a precisão e a sequencialidade de um problema matemático”, e não “ao acaso nem à intuição”. Para tanto, o autor se vale do seu poema mais famoso para provar seus pontos. No segundo e mais hermético dos ensaios, A razão do verso, Poe discute sobre a prosódia da língua inglesa e a versificação – sobretudo, a latina. Este é um texto longo e que pode ser um tanto cansativo àqueles que não têm proximidade com a teoria da construção de um poema. E por fim, temos O princípio poético, no qual o autor discursa sobre a maneira como ele enxerga o poema, chegando a dizer que um poema ideal não deve ser nem longo demais nem curto demais.
Encerrando a segunda parte da obra, e com isso, a própria obra, temos um ótimo ensaio crítico do Paulo Henriques Britto chamado O ensaísta Poe, que como o título já sugere, investiga Edgar Allan Poe enquanto ensaísta. Aqui, Britto procura ser preciso ao apontar os equívocos realizados por Poe nos ensaios presentes no livro, porém os contextualiza, nos fazendo entender o porquê do autor tê-los cometido. Britto também aproveita para nos lembrar que Poe era um antiabolicionista e que ter isso em mente se faz importante para entendermos parte das escolhas feitas por ele. E em suas últimas linhas, nos alerta dos perigos que o discurso que defende uma arte livre de “posições ideológicas” pode carregar.
Esta luxuosa edição de O corvo é recomendada a todos que admiram o famoso poema de Edgar Allan Poe e, além disso, têm interesse em conhecer mais sobre a obra e o posicionamento do autor quanto à criação poética. Também é um livro indicado para todos aqueles que se dedicam aos estudos da poesia. A organização de Paulo Henriques Brittos e os seus próprios ensaios que estão presentes na obra amplificam a força do poema assim como estimulam ótimos debates. O corvo abarca em suas 199 páginas um conteúdo enriquecedor e que faz jus à grandiosidade do poema.
*Exemplar recebido em parceria com a editora.