Quem tem medo do feminismo negro?- Djamila Ribeiro


Quem tem medo do feminismo negro?, de Djamila Ribeiro é um livro composto por artigos originalmente publicados, em sua maioria, no blog da CartaCapital entre 2014 e 2017.
O livro tem início com uma introdução inédita intitulada “A máscara do silêncio”, na qual a autora relembra episódios da infância e adolescência e sua relação com  família, assim como episódios em que o racismo e sexismo tentaram inferiorizá-la e relata o processo pelo qual passou enquanto entendia esses sistemas de opressão. A partir do título a introdução também vai no sentido de demonstrar como, por muitos anos, as mulheres foram silenciadas, a partir da metáfora da máscara usada no período da escravidão. 
Nesses relatos, profundamente pessoais, é possível perceber que muitos episódios vivenciados por Djamila são semelhantes aos que muitas meninas negras passaram na infância.

“A vontade de ser aceita nesse mundo de padrões eurocêntricos é tanta que você literalmente se machuca para não ser a neguinha do cabelo duro que ninguém quer” (p.14).

Para Djamila a leitura de outras mulheres negras foi fundamental para sua formação e o texto introdutório é concluído com a afirmação de que “É imprescindível que se leia autoras negras, respeitando suas produções de conhecimento e se permitindo pensar o mundo por outras lentes e geografias da razão” (p.27).

Os artigos presentes neste livro versam sobre assuntos atuais, os quais Djamila retoma para mostrar o quanto a sociedade é racista e misógina, embasada por outras pesquisadoras, em  sua maioria negras. 
O primeiro assunto que vem à tona é como o racismo se faz presente no que se pretende humor. Em um determinado momento do artigo “O verdadeiro humor dá um soco no fígado de quem oprime”, Djamila pontua: “Sendo a sociedade racista, o humor será mais um espaço onde esses discursos são reproduzidos. Não há nada de neutro – ao contrário, há uma posição ideológica muito evidente de se continuar perpetuando as opressões” (p.29).
Outros assuntos tratados ao longo do livro são o racismo nos veículos das mídias, racismo contra as práticas de religiões de matriz africana, miscigenação, defesa das cotas raciais, episódios racistas nos esportes, como futebol e tênis, entre outros.

“Racismo é um sistema de opressão e, para haver racismo, deve haver relações de poder. Negros não possuem poder institucional para ser racistas. A população negra sofre um histórico de opressão e violência que a exclui” (p.41)

Djamila é didática ao falar sobre racismo e feminismo. No artigo que dá nome ao título do livro, a autora situa historicamente o surgimento do feminismo negro, mas pontua que mesmo antes dessa época haviam mulheres negras que questionavam seu lugar na sociedade, como foi o caso de Sojouner Truth. A autora finaliza este artigo indicando feministas negras para quem quer começar a entender melhor sobre o assunto. Uma dessas feministas negras é Grada Quilomba, que a autora teve oportunidade de entrevistar e essa entrevista está presente neste livro.

Outra característica marcante da escrita de Djamila é a ironia, pois só através dela se pode falar sobre certos casos, como o famigerado “racismo reverso”. Um dos artigos em que é possível ver a ironia da pesquisadora é “Racismo: manual para os sem-noção”, em que a partir de falas absurdas formula respostas que vão diretamente no cerne da questão.

O título do livro é uma provocação e nos faz pensar em quem teria medo do feminismo negro. A resposta que se chega é que não são as mulheres negras, são as pessoas brancas, então o público alvo são justamente essas pessoas. Nesse sentido, o livro é um importante material para se pensar em um discurso antirracista para estabelecer diálogo com quem ainda insiste em não acreditar na existência de racismo no Brasil e mais do isso, é importante para discutir feminismo interseccional. Também é um excelente material para quem quer conhecer outras feministas negras.

Foi impressionante, o quanto, na introdução, me identifiquei com as experiências pessoais que Djamila vivenciou na infância. O caso do cabelo alisado para ser bem aceita pelas colegas da escola é só um exemplo disso. Então, de minha parte, sinto muito empatia por sua história de vida e minha admiração por ela, por sua trajetória e história de vida só faz aumentar. Djamila Ribeiro é uma grande inspiração.

A Companhia das Letras acertou em cheio ao publicar este livro. Por mais que a internet seja democrática e facilite o acesso aos artigos, é bom ter acesso aos textos de Djamila reunidos em um livro para que possamos fazer marcações, dar de presente e indicar para quem precisa de leituras assim.

Em junho deste ano, na ocasião do lançamento do livro para blogueiras parceiras e a imprensa, participei da gravação de um vídeo em que foi feita a leitura de trechos da introdução.
Confiram:
          

*Livro enviado pela editora.

4 respostas

  1. Ainda não li nada da Djamila. Quem sabe começo agora, porque com certeza é essencial para entendermos nossa sociedade.

    Além de seguir o blog pelo GFC e seguir no Google+, também sigo o seu e o das editoras no Instagram (@chaves_natalia)

  2. Gostaria muuuuito de ler esse livro!!!! Ainda não tive como compra-lo.
    Sigo sigo seu perfil no instagram há algum tempo e também estou seguindo as editoras (@annac.ramalho facebook/annacramalho)
    Um grande beijo!! Gosto mto do seu conteúdo! <3

  3. Menina, já queria o livro antes de ler a resenha, agora quero muito mais. Não imaginava que ele tinha tantas abordagens diferentes assim!! E ele também e o livro do Leia Mulheres de PoA esse mês. Tô torcendo muito por esse sorteio!! E essa resenha tá maravilhosa 💖

  4. Uma leitura necessária. Precisamos refletir muito e pra isso precisamos ver além do que habitualmente vemos, conhecer a realidade de outras pessoas é o melhor caminho.

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Maria Ferreira

Maria Ferreira é uma mulher negra baiana. É criadora do Clube Impressões, o clube de leitura de livros de ficção do Impressões de Maria, e co-criadora e curadora do Clube Leituras Decoloniais, voltado para a leitura e compartilhamento de reflexões sobre decolonialidade. Também escreve poemas e tem um conto publicado no livro “Vozes Negras” (2019). É formada em Letras-Espanhol pela Universidade Federal de São Paulo. Seus principais interesses estão relacionados com temas que envolvem literatura, feminismo negro e decolonial e discussões sobre raça e gênero. Enxerga a literatura como uma ferramenta essencial para transformar o mundo. 

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