Filmes e livros para o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+

O Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+ como conhecemos hoje não existiria se não fosse pelas mulheres trans negras e latinas, comandadas por Martha P. Johnson e Sylvia Riveira, que começaram a Revolta de Stonewall lá atrás, em 1969. Isso é um fato que não pode ser mudado, mas que é constantemente ignorado — ou descaradamente deixado de lado — pelas novas gerações pertencentes à comunidade. Se hoje em dia casais do mesmo sexo possuem direitos, foi por causa da luta de duas mulheres trans, portanto é inadmissível a nossa apatia em aceitar como casais gays brancos são constantemente os que mais possuem privilégios e são os mais aceitos na sociedade como um todo. Foi pensando nesse dia especial que eu compilei uma lista com quatro filmes e quatro livros protagonizados pela própria causa LGBTQIA+.

FILMES

1 – A Morte e Vida de Martha P. Johnson, 2017 (David France)

Dirigido por David France, o documentário narra as vidas de Martha P. Johnson e Sylvia Riveira, duas das mais importantes figuras na luta pela liberação trans e gay entre as décadas de 60 e 90. A ativista Victória Cruz investiga a morte de Johnson em 1992, que em circunstâncias misteriosas, foi dada como suicídio. Para termos um exemplo da importância das duas mulheres, basta sabermos que ambas foram as fundadoras da STAR (Street Transvestite Action Revolutionaries), um coletivo revolucionário que ajudava jovens abandonados por seus familiares, oferecendo alimento, casa e abrigo. Uma obra importante por trazer novamente aos holofotes os nomes de quem começou todo o movimento. “A Morte e Vida de Martha P. Johnson” está disponível na Netflix.

2 – Tatuagem, 2013 (Hilton Lacerda)

Evidentemente relevante nos dias atuais, “Tatuagem” conta a história de amor proibido entre Fininho (Jesuíta Barbosa), um soldado do exército, e Clécio (Irandhir Santos), um organizador de um cabaré anarquista durante a Ditadura Militar em 1964. Colorido, quente, dançante e revoltante. Este é o mundo criado por Hilton Lacerda para contar as dores e os amores de uma relação que tinha tudo para dar errado. “Tatuagem” está disponível na Netflix.

3 – Califórnia, 2015 (Marina Person)

Estreia na direção de Marina Person, “Califórnia”, a princípio pode parecer um filme clichê oitentista de adolescentes descobrindo suas particular fase “sexo, drogas e rock n roll”, mas a fundo, a diretora conta uma história de aceitação, descoberta sexual, tabus e drama familiar de uma geração que teve seu desabrochar sexual junto com a pandemia do vírus HIV. Caio Blat interpreta Carlos, o tio da protagonista Estela (Clara Gallo), uma menina que graças ao tio, descobre o mundo californiano através de cartas, fitas cassetes e fotografias. Seu sonho de passar as férias com o tio é cancelado quando ele, debilitado após ter contraído AIDS, volta dos Estados Unidos para viver com a família de Estela. Com uma trilha sonora que conta com David Bowie, The Cure, Joy Divison, e New Order, o filme aposta também na androginia dos personagens — o que dialoga perfeitamente com os vocalistas das bandas já citadas. “Califórnia” está disponível na Netflix.

4 – Pariah, 2011 (Dee Rees)

Semi-autobiográfico, “Pariah”, dirigido de forma fabulosa — e por vezes dolorosa e surpreendentemente engraçada — por Dee Rees em 2011, é uma pequena joia do cinema LGBTQIA+ na história recente. Adaptado de um curta da mesma Dee Rees, o filme aborda o dilema de Alike, uma adolescente negra de um bairro homofóbico que está começando a entender sua identidade de lésbica butch durante uma fase turbulenta do casamento dos pais — que a encurralam com heterossexualidade compulsória, feminilidade estereotipada e religião. “Pariah” está disponível na Netflix.

LIVROS

1 – Não Digam Que Estamos Mortos (Danez Smith)

Urgente. Nenhuma outra palavra poderia descrever melhor a importância de termos alguém como Danez Smith, que escreve não apenas sobre sua vivência à margem enquanto negre, não-binário e soropositivo. Seus poemas também são sobre a violenta e racista polícia norte-americana, que coloca um alvo nas costas de cada corpo negro assim que o mesmo coloca os pés fora de casa. Danez Smith faz uma crua análise sobre a objetificação do corpo negro que se mistura com história do produto em sua vida familiar, passando desde seu uso por suas tias como remédio para queimaduras de frituras, até chegar em seu uso erótico. Confira o texto completo aqui.

2 – Identidade (Nella Larsen)

Em pouco mais de 100 páginas, Identidade, lançado em 1929, no auge do movimento atualmente conhecido como Harlem Renaissance, aborda a passabilidade heterossexual de duas amigas negras de pele clara que também se passam por brancas. O racismo internalizado, e o desejo de ser racialmente invisível nos anos 20 também é abordado. O livro pode ser um estudo importantíssimo sobre como traumas relacionados ao racismo na infância podem ser usados como combustível para uma miscigenação forçada que pode significar uma certa segurança social e racial para os filhos. Confira o texto completo aqui.

3 – A arte queer do fracasso (Jack Halberstam)

 

Em A arte queer do fracasso, Jack Halberstam usa uma série de referências à indústria cinematográfica, mais precisamente à criação de animações infantis da Pixar e Dreamworks para teorizar sobre o lado bom do fracasso. Para isso ele traça uma linha de pensamento clara: a ideia de sucesso na vida é intrinsecamente ligada ao binarismo heteronormativo norte-americano. Esse sucesso, no caso dos homens, evidentemente significa ter um bom emprego, ser viril, possuir uma mulher e construir uma família nuclear. Já à mulher, resta o “sucesso” de ser a esposa submissa de um homem bem-sucedido e ser uma dona de casa exemplar. O texto completo pode ser acessado aqui.

4 – Um apartamento em Urano (Paul Preciado)

As crônicas aqui são barulhentas, corrosivas, repletas de revolta, de sensualidade, de anarquia sexual; são explicitamente contra qualquer ideia arcaica e binária a respeito da sexualidade. Elas acompanham os acontecimentos políticos, sexuais e tecnológicos ao redor do mundo, ao mesmo tempo em que o autor, que durante muitos anos era lido socialmente como mulher e lésbica, continua seu lento processo de transição hormonal, e busca a mudança de nome. Confira o texto completo aqui.


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Maria Ferreira

Maria Ferreira é uma mulher negra baiana. É criadora do Clube Impressões, o clube de leitura de livros de ficção do Impressões de Maria, e co-criadora e curadora do Clube Leituras Decoloniais, voltado para a leitura e compartilhamento de reflexões sobre decolonialidade. Também escreve poemas e tem um conto publicado no livro “Vozes Negras” (2019). É formada em Letras-Espanhol pela Universidade Federal de São Paulo. Seus principais interesses estão relacionados com temas que envolvem literatura, feminismo negro e decolonial e discussões sobre raça e gênero. Enxerga a literatura como uma ferramenta essencial para transformar o mundo. 

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