Nojo é o livro mais recente da escritora Divanize Carbonieiri, indicada em 2020 ao Prêmio Jabuti na categoria conto com o livro Passagem Estreita.
Seria difícil definir o gênero deste livro, mas é uma obra em que a voz narrativa faz uma série de críticas a respeito dos corpos de outras pessoas, demonstrando suas próprias concepções sobre o que acredita que é feio ou bonito. Em muitos momentos a voz diz ter nojo e daí vem o título, do nojo, da vontade de não olhar profundamente para algo. A voz narrativa expõe muitos dos julgamentos feitos pela sociedade, típicos principalmente em quem tem a mania de cuidar mais da vida alheia do que da própria vida. Afinal, é muito mais fácil olhar para o outro do que para si.
Esse nojo muitas vezes se transforma em preconceitos que a voz demonstra ter, reproduzindo muitos comentários que nos cansamos de escutar e por que não, chegamos a reproduzir em muitas ocasiões? Uma vez que fazemos parte de uma sociedade pautada em padrões socialmente impostos, é comum muitas vezes olharmos para as outras com pessoas com nojo.
A forma como a voz narrativa se expressa é bastante agressiva. Muitas vezes com comentários sutis, mas agressivos. Sutis porque muitas vezes os escutamos em lugares muitos próximos, como em nossa própria família. E agressivos porque quem está sob julgamento sabe como muitas vezes, mesmo sem querer, as pessoas nos machucam. É possível que nós que estamos aqui, partilhando este livro, esta resenha, também já tenhamos feito comentários assim, sutis e agressivos em menor ou maior medida.
Nojo é um apanhado de opiniões que, afinal de contas, que seriam bem melhores se ficassem guardadas dentro de quem resolveu dizer. No entanto, também é um convite para a reflexão sobre o quanto estamos o tempo todo envolvidos por preconceitos. A voz narrativa não é empática e fico com esta reflexão, precisamos de empatia. Precisamos olhar as pessoas com mais empatia.
A voz narrativa é tão preconceituosa que em muitos momentos temos neste livro uma leitura indigesta, mas talvez não tão indigesta quanto os discursos midiáticos que reforçam os padrões. De qualquer forma, te garanto que você vai sentir vontade de ler até o final: em primeiro lugar porque essa característica é uma das grandes qualidades do livro, e em segundo porque você terá curiosidade de saber mais sobre quem é aquela voz que está ali. Durante a leitura, pensamos, por que tanto preconceito?
A minha impressão é de que não falta só empatia, mas também falta afeto. Me parece que o nojo é um sentimento que vem sendo construído dentro de alguém há muito tempo, desde o dia que nascemos, o nojo é socialmente compartilhado e direcionado a tudo que desvia dos padrões. Fiquei pensando: quais são as consequências para a nossa saúde mental, o fato de não estarmos dentro dos padrões da sociedade?
Um efeito de leitura muito interessante que o livro produziu em mim é que muitas vezes parecia que as críticas eram direcionadas ao meu corpo e lendo me senti julgada por aquela voz, mas também fui levada a fazer uma autocrítica e refletir se não sou também uma “reparadora” do corpo alheio.
Nojo é um livro com várias camadas de leitura, com uma linguagem muito bem construída pela autora Divanize Carbonieiri, que vem experimentando em vários gêneros literários e trazendo muita coisa boa para a literatura contemporânea.
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