“Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade”, de bell hooks

O livro Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade de bell hooks já foi mencionado algumas vezes aqui no blog Impressões de Maria. Em 2018 a Maria comentou que o livro foi a primeira leitura que ela fez em uma das disciplinas que cursou na UNIFESP e neste ano, o livro foi uma das leituras indicadas na lista 21 livros para 2021. E esta foi uma das minhas primeiras leituras de 2021.

Fiquei tão tocada com esta leitura que não podia deixar de escrever sobre as reflexões que a bell hooks traz porque acredito que esta seja uma leitura que todo mundo que trabalha com educação, ao menos como uma educação compromissada com a inclusão social, deve realizar.

Ensinando a transgredir teve sua primeira publicação em 1994 e foi publicado aqui no Brasil pela Martins Fontes em 2013, quando vi o ano de publicação, fiquei um pouco surpresa por nunca ter tido essa sorte da Maria de ler este livro em uma disciplina da faculdade, afinal, fiz uma licenciatura e fiquei me perguntando se algum dia minha turma chegou perto de uma discussão deste nível. Mas tudo bem, nunca é tarde para ampliarmos os horizontes, olhar umas ementas de disciplina, questionar as referências bibliográficas e até mesmo ter a humildade de sugerir uma ou outra referência que possa contribuir com o aprendizado coletivo. Então para justificar porque penso assim, quero comentar essa minha leitura maravilhosa que fez minha lista de 2021 começar melhor!

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No livro Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade a escritora, professora e pesquisadora bell hooks discute o ensino a partir da premissa do multiculturalismo. Como a palavra sugere, o multiculturalismo conceitua a existência de múltiplas culturas em um mesmo território. Trazendo para a área da educação, poderíamos dizer assim: múltiplas culturas dentro de uma mesma sala de aula.

O conceito não deve ser estranho para quem trabalha com a educação porque é um dos focos das discussões pedagógicas, mas como hooks afirma no capítulo 3, “não há de longe, discussões práticas suficientes acerca de como o contexto da sala de aula pode ser transformado de modo a fazer do aprendizado uma experiência de inclusão” (HOOKS, 2013, p. 51).

É possível observar que muitas vezes, talvez, na maioria das vezes, a sala de aula não é um ambiente inclusivo e para hooks esta é uma questão central, por isso, em Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade a autora nos ajuda a pensar em possibilidades para transformar a sala de aula em um ambiente mais acolhedor para todo mundo que está dentro dela.

Ela pontua que falar de obras brancas é uma atitude política, mas que levar obras de autoria negra não é uma atitude que garante a inclusão. Para hooks é preciso não só rever a lista de obras trabalhadas na sala de aula, mas também mudar o ensino. Nos cursos de licenciatura falamos muito sobre a formação de estudantes, mas a autora nos alerta que é preciso também formar os professores que exercem este ofício, mas que muitas vezes não sabem praticar a inclusão.

A autora defende um ensino progressista que promova a inclusão e tem como uma de suas referências a obra de Paulo Freire, que reflete um jeito de ensinar que é modificado pelo desejo de promover a inclusão. Por isso hooks propõe que os professores examinem criticamente o próprio comportamento em sala de aula e tenham disposição para abordar o ensino a partir de um ponto de vista que considere e promova uma consciência de raça, gênero e classe social. Para ela, adotar o multiculturalismo é pensar: Quem fala? Quem ouve?

Parece muito simples esta questão, mas quando chegamos no capítulo 8 do livro e observamos alguns casos mencionados pela autora, é perceptível que não basta uma vontade de mudar, mas que é necessário mudar realmente. Temos como exemplo dado por hooks, estudantes que não se sentem à vontade para falar em sala de aula. Ela aprofunda a reflexão citando que os estudantes negros se sentem menos à vontade para falar do que brancos, e estudantes negras se sentem menos à vontade para falar do que os estudantes negros. Aqui notamos uma questão estrutural de raça e gênero que deve nos levar a refletir: Como fazer com que todas, todes, todos estudantes se sintam à vontade para falar dentro da sala de aula?

Esta questão me pegou muito porque, enquanto professora, me percebo como alguém que deve mediar as vozes dentro da sala de aula e promover a inclusão, entretanto, é possível, com muita facilidade, perceber que há um desnivelamento na forma como estudantes se posicionam dentro da sala de aula, e esse desnivelamento revela a desigualdade social e diferença de privilégios que existem dentro da nossa sociedade. Como lidar com isso?

Enquanto estudante e professora branca, penso que não ter uma postura racista não é o suficiente, penso que é importante ser uma aliada de quem acredita que não pode ter voz. Enquanto estudantes podemos ter uma postura mais acolhedora com quem não se sente tão à vontade para falar e enquanto professores devemos garantir que todos possam falar. É um trabalho cotidiano que não se encerra em uma única aula. A autora bell hooks sugere alguns caminhos nesse sentido, por isso considero esta leitura importante, a proposta da hooks vem da prática do ensino como transgressão às formas já estabelecidas que tanto nos limitam.

Minha intenção com esta resenha é comentar o livro e compartilhar em que lugar esta leitura mais me toca e não facilitar o pensamento da bell hooks para quem está lendo. Digo isso para elogiar também a escrita dela porque é um livro teórico muito interessante de ler, acolhedor e inclusivo. É um livro que dá para compreender sem que seja necessária uma resenha para facilitar. É uma leitura gostosa, sabe? Para ler, aprender e refletir com a bell hooks.

No capítulo 13, “Eros, erotismo e o processo pedagógico”, ela fala sobre a importância do afeto dentro da sala de aula e eu acredito muito nisso. Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade me traz essa sensação, de que para incluir e transgredir, é preciso que a gente tenha mais afeto. É preciso que a gente reconheça as diferenças a fim de torná-las menores e fazer delas um potencial para a reflexão e discussão. Uma sala de aula multicultural com docentes que promovam a inclusão é um ambiente cheio de afeto, aprendizado e crescimento.

Nem sempre isso acontece, mas quando cheguei na última página de Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade percebi que eu fiquei com muita vontade de ser aluna da bell hooks. Portanto, recomendo este livro e além disso, desejo ter a oportunidade de ler outras obras desta autora.


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Uma resposta

  1. Esse livro é tão importante, tão valioso nos dias atuais. Eu tenho ele na minha estante , mas é um da bell hooks que eu ainda não li. Preciso resolver isso imediatamente, principalmente pelo diálogo, ou mesmo influência de Freire em sua obra

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Maria Ferreira

Maria Ferreira é uma mulher negra baiana. É criadora do Clube Impressões, o clube de leitura de livros de ficção do Impressões de Maria, e co-criadora e curadora do Clube Leituras Decoloniais, voltado para a leitura e compartilhamento de reflexões sobre decolonialidade. Também escreve poemas e tem um conto publicado no livro “Vozes Negras” (2019). É formada em Letras-Espanhol pela Universidade Federal de São Paulo. Seus principais interesses estão relacionados com temas que envolvem literatura, feminismo negro e decolonial e discussões sobre raça e gênero. Enxerga a literatura como uma ferramenta essencial para transformar o mundo. 

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